Vênus em Escorpião

Curitiba, 04 de dezembro de 2023

Oh, guardião das águas tranquilas e profundas,

Venho movida pelos ventos e chego à beira da tua quietude com reverência e humildade.  Reconheço tua força, poder e domínio sobre estas águas e solicito, humildemente, permissão para adentrar o teu reino sombrio e misterioso. Aceito a dor do exílio e procurarei compreender, em tuas terras, as nuances do amor em ambientes menos acolhedores, mesmo que isso signifique enfrentar minha própria vulnerabilidade.  Que minha jornada seja guiada por tua sabedoria e coragem. Que tua intuição afiada me aponte sentimentos ocultos e me permita compreender além das aparências. Que minha vela, mesmo com a ausência de ventos, encontre, em meio à imobilidade, um caminho para flutuar com harmonia e serenidade. Que eu seja capaz de encontrar um propósito na tua profundidade.  E que meu coração velejador possa coexistir em equilíbrio com a tua intensidade desafiadora.

Que assim seja.

Mercúrio em Capricórnio

São Paulo, 01 de Dezembro de 2023

Berê,

Cheguei. Aqui, a paisagem é cinza. O pouco verde é espinhento e intercala-se entre as pedras e o chão batido. De longe, observo as cabras negras batendo os cascos na terra seca. Acostumadas à restrição, não têm espaço para devaneios. Proibidas de folhas, são só raiz e talos. Resilientes e determinadas, fazem das barreiras estruturas sólidas, sobre as quais ascendem em direção ao céu.

Me identifico com elas. Não é fácil chegar ao fundo, ao enraizamento das ideias. A restrição, imposta pelo mundo, ao mesmo tempo que nos limita, nos fortalece e nos permite desenvolver uma estrutura cuidadosa e perspicaz. Carrego pensamentos poucos, mas essenciais. Suficientes para me fazerem alcançar os ares. É que, quanto mais para dentro eu penso, mais perto das águas de cima eu chego. Assim como a cabra realista, grosseira e áspera, eu, trancada por dentro, rumino o vasto nada. E, insolente, me sinto capaz de pedra.

Olívia

Lua em Gêmeos, Mercúrio em Sagitário – oposição

São Paulo, 28 de novembro de 2023

Moacir,

Estou hospedada em sua casa e, embora me sinta um tanto perdida por aqui, estou tentando não tirar nada do lugar. Porém, quando cheguei, tropecei no pé da estante e parece que misturei alguns verbetes que estavam tão arrumadinhos… Organizei como pude, mas me parece que não fazem muito sentido do jeito que estão. Estou aqui quebrando a cabeça para deixá-los em ordem, mas não consigo encontrar lógica na sua arrumação. Será que você os organizou em um momento de confusão? Porque não fazem sentido…

Fiquei sabendo que você tem andado distante, que tem passado muito tempo longe de casa. Estão dizendo que você, agora, só anda com gente estranha, que passa muito tempo cavalgando e que anda distribuindo coices. Eu sei que, às vezes, precisamos nos entregar à vida, tentar coisas diferentes, refazer amizades… mas mudar tudo completamente não me parece correto. 

Também não quero que me entenda mal. Você me abriu as portas da sua casa gentilmente e sabe o apreço que tenho por você. São essas suas novas companhias que me preocupam. Bem, eu fico por aqui mais um dia e sigo minha jornada. Espero que você saiba o que está fazendo. Se precisar de algum conselho, amanhã, já estarei em minhas terras e acho que posso ser mais útil de lá. Desculpe o desarrumado das palavras.

Sueli

Sol em Sagitário, Lua em Áries

São Paulo, 22 de novembro de 2023

Gomes,

Eu realmente achei que, se desse um tempo antes de te responder, eu teria algum para esfriar a cabeça. Mas sinto dizer: não funcionou. O que se passava pela sua cabeça quando me fez aquela pergunta, insinuando que eu estava fazendo algo errado por causa de 30 minutos de atraso? O que se faz em 30 minutos, hein? Você deve saber o que dá pra fazer, por isso ,estava preocupado.

Como já disse ontem, a loja fechou com um cliente dentro e ele não estava preocupado com o que o meu marido ia pensar se eu me atrasasse 30 minutos para chegar em casa. Passei no bar ao lado, que você conhece muito bem, peguei uma cerveja, porque eu mereço, e fui pra casa. Cheguei cansada, querendo um carinho, um sofá pra descansar, comer alguma coisa…

E você me vem com essa? Da próxima vez em que você fizer esse tipo de insinuação, eu não respondo por mim. Se era só preocupação, por que não me ligou? Você sabe que eu não tenho crédito pra ligar, mas o celular estava todo o tempo na minha mão. Era só ter ligado, seu inútil! Agora, chegar cansada e ainda ter que aguentar ciúme de homem mal resolvido? Me poupe. O que você achou? Que eu estava rodando a bolsa no ponto de ônibus, seu palhaço? Não fala comigo enquanto minha raiva não passar. 

Tá avisado.

Cléria

Lunação de Escorpião seguida por Lua e Marte em conjunção 

São Paulo, 13 de Novembro de 2023

Jorge,

Agradeço por me receber de forma tão hospitaleira em seus domínios e, também, por estar ciente do quão difícil esta situação é para mim. Os últimos dias, confesso, têm sido desconcertantes e desesperadores. Andei aos tropeços, fui ferida, senti-me triste e intoxicada. Apesar disso, é reconfortante reconhecer em você (alguém em quem eu jamais pensaria) um ombro amigo. Porque é difícil, Jorge, quando estamos no auge da aflição, distinguir entre o certo e o errado, entre o bom e o mau. E sinto que estive buscando leite na casa do carneiro, ou seria melhor dizer, na casa do escorpião.

Em momentos de agonia, nos deixamos levar pelas respostas fáceis, por aquilo que parece nos aliviar o fardo rapidamente, mesmo que a intuição nos alerte de que algo parece errado. Nesses momentos, vamos a  lugares errados em busca de coisas erradas, porque a única coisa que importa é aliviar a dor. Uma pausa para um respiro e não nos jogaríamos do precipício em busca do voo da liberdade. Porque as asas, Jorge, só rebentam quando temos os pés firmes no chão. Isso é certo. 

E por estar certa de que vou me recuperar, despeço-me, pois sinto que devo continuar minha jornada. Já sinto um fio de vitalidade me alcançando e quero que ela me encontre caminhando. Obrigada por ser o melhor amigo que pôde.

Com afeto,

Berenice

Mercúrio em Sagitário

São Paulo, 10 de novembro de 2023

Querida Beatriz,

Ontem, falei com Heitor. Olhos nos olhos. Novamente.

Sabe aquele sentimento de que algo não se encaixa? De quando as coisas parecem perfeitas demais? Pois é, ainda o sinto. Mas, ontem, por um momento, tive um vislumbre daquilo que pode ser o incitante desse sentimento: Heitor falava sobre mulheres que não consultam seus parceiros sobre coisas do dia a dia. E,  então, perguntei: e você acha, Heitor, que eu sou o tipo de mulher que pediria permissão ao meu parceiro para fazer qualquer coisa que fosse? 

Bia, nós estávamos sentados em um café, de frente um para o outro. Heitor estava de cabeça baixa, ocupado, separando um pedaço de bolo do seu prato para acompanhar o gole de café. Então, ele parou por um instante e, sem mover a cabeça, levantou os olhos em direção aos meus. Foi ali que a flagrei: a besta que me espreita. A fera que pulsa por trás do porte alinhado e civilizado. Ao perceber que fora descoberta, Heitor retorna ao humano e responde, educadamente, que não vê sentido em continuar a conversa. Diz que está satisfeito e pede a conta. 

Ele pensa que ela está domada, mas é ela que o possui, paciente, aguardando pelo momento certo, pelo deslize crucial… Um único descuido e ela saltará para fora, tomada da fúria de um animal encarcerado.  É ela que desperta os meus gatilhos, amiga. É por ela que sinto, no fundo das minhas entranhas, que Heitor não é o príncipe que se diz ser.  É preciso crer, minha amiga, no que dizem nossas vísceras.

Afetuosamente,

Juliana

Lua em Virgem, Júpiter em Touro

São Paulo, 07 de Novembro de 2023

Novo amor, 

Cheguei. Parada à porta, respirei fundo uma última vez. Me lembrei do longo caminho percorrido, da poeira da estrada, das noites frias e solitárias… Bati… Como a porta estava apenas encostada, fui entrando. Percebi, pela sala arrumada, que me esperava. Tão bom encontrar tudo limpo e organizado, um perfume de tempo novo…

Meus pés se afundaram no tapete burgundy macio. E, enquanto as almofadas de seda que habitam o sofá me acolhem e me afagam, eu penso “sim, é aqui.” Atrás de mim, a porta continua aberta. Te peço: não a feche. Portas fechadas escurecem o ambiente, criam pontos de umidade, deixam o ar pesado e malcheiroso .

Se a porta for daquelas que têm trancas, sobretudo as pesadas, então, são piores: nesses casos, o bolor logo se instala, o ar perfumado se torna fétido e as paredes, sem demora, sangram rancores verdes e gosmentos. Você percebe, novo amor, o quão tóxica pode ser uma porta, uma barreira? Não, deixe-a aberta. Pois, enquanto estiver aberta, saberei que permaneço por vontade.

Sua,

Josephine

Saturno em Peixes e em movimento direto

São Paulo, 04 de Novembro de 2023

Neide de Deus,

Você percebeu que o tempo parou? Fala pra mim que percebeu! Eu não sei, ando meio tonto ultimamente, um pouco desorientado até. Tinha feito toda uma programação de vida e decidi voltar atrás. Depois, aquilo já não fazia mais sentido e decidi retomar algumas coisas que tinha deixado…

Mas, há uns dias, percebi que estava parado. Sempre fui lento. Mas, parado é lento demais até pra mim. Parece que experimentei algum tipo de coma, como se pudesse me observar de fora do meu corpo: aquele corpanzil ali, parado, inerte. Achei até que tinha ido de “arrasta”, minha Deusa. Que susto! Um esforço enorme para conseguir respirar, um sufocamento, um afogamento… Parecia que meu corpo flutuava em águas também paradas, de tão calmas. 

E com você, como foi? Se apavorou também? Lembrei daquele filme do Spielberg em que a pessoa descobre que consegue parar o tempo e faz isso no instante em que uma bomba está prestes a tocar o solo, o que o condena a permanecer no tempo parado para sempre.

Que medo eu tive.

Prefiro que o tempo corra, no tempo de cada um, mas que corra. Prefiro as mudanças que me roubam a saúde e a vitalidade do que ser condenado à imobilidade. Desculpe a euforia, minha amiga, mas é que acabo de despertar dessa paralisia angustiante. Preciso vê-la.

Seu,

Jorge

Lua em Câncer, Saturno em Peixes

São Paulo, 1º de Novembro de 2023

Irene querida, 

Ontem, passei por uma situação incomum em um supermercado: um homem começou a falar comigo como se me conhecesse. Já que  não o reconheci, disse-lhe, educadamente, que ele havia se enganado, no que ele insistiu. E começou a me perseguir dentro do mercado. Quando eu já não sabia mais o que fazer, resolvi parar e fingir que era a pessoa que  aquele homem procurava. Disse-lhe : “tudo bem, vou fingir que sou a pessoa que você  procura. Pois o homem ficou doido. Disse  que eu não sabia de  nada, que devia respeitá-lo e falava: “você não sabe de nada. Eu morri ontem, sabia? Por isso, não encontrei você”.

Enfim, ninguém no supermercado me ajudou ou tomou conhecimento da situação. E eu fiquei pensando sobre isso, em como nossa geração foi ensinada a fingir que não vê. Me permita, minha amiga, fazer uma correção sobre nossa última conversa, em que  dizíamos que, antigamente, tudo era melhor. 

Não era, amiga. O “antigamente” gerou a situação que temos hoje: indiferença, conservadorismo, aumento de violência, ganância, guerras, fome. Gerou pessoas que confundem sucesso com acúmulo de bens, com não precisar de ninguém para nada, que vivem solitárias pois não são capazes de compartilhar. Nós erramos muito, minha amiga, como geração. Acabo de perceber que esse “passado glorioso” é uma mentira que contamos a nós mesmos para não encararmos a verdade. A verdade é que o nosso passado está a um passo de estragar o futuro de todos.

Fátima

Mercúrio oposto a Júpiter / Mercúrio conjunto a Marte

São Paulo, 29 de Outubro de 2023

Amigos,

Recentemente, visitei o restaurante Chez Jupiter que, vocês já devem ter ouvido falar, se apresenta como o novo oásis gastronômico de São Paulo. Logo na entrada, percebe-se um ambiente opulento com tons que se pretendem exuberantes, nas palavras da hostess, mas que, na verdade, não passam de exagerados e cafonas.

O cardápio, embora apresentado com pompa, carece de originalidade em sua execução. Como prato principal, optei pela sugestão do chef Dominic Olivera, um bife com molho de vinho tinto e cogumelos selvagens. Infelizmente, o sabor estava longe de corresponder às expectativas. O bife, embora de qualidade, pecava pela falta de tempero e pela uniformidade da textura, uma verdadeira decepção. Os acompanhamentos, legumes grelhados e purê de batata, não apresentaram nada que justificasse o alto preço. 

A carta de vinhos, embora extensa, não exibe nenhum destaque. É como um traje luxuoso, mas sem a personalidade que o justifique. Os vinhos servidos eram, na melhor das hipóteses, competentes, mas não memoráveis. A sobremesa, uma torta de chocolate negro e caramelo salgado, trouxe algum alívio à refeição. Contudo, seu sabor, embora agradável, não era suficientemente distinto para elevar a experiência como um todo.

Enfim, o Chez Jupiter parece apoiar-se na extravagância, mas a execução de seus pratos não acompanha essa promessa. A falta de originalidade e a relativa falta de sabor deixaram muito a desejar. Enquanto a atmosfera era opulenta, a comida em si não justificou o alarde. Como crítico, não posso deixar de expressar minha decepção com o que deveria ter sido uma experiência gastronômica intensa e inovadora.

Edgard Philippe