Lua em quadratura com o Sol
Amada neta,
Meus ossos já não são tão fortes e meu corpo já não é tão ágil como eu gostaria. Os dias passam em câmera lenta e as lembranças sobrepõem-se umas às outras num looping infinito. A experiência é um peso que nos curva as costas e enfraquece os joelhos.
Sinto a desaceleração da vida a cada dia e no fim há a morte.
Mas a morte não é o fim. A morte é somente a devolução da matéria à sua origem. Matéria esta que será reciclada no ventre do mundo e animará uma nova existência. Assim, a vida se repete e ao mesmo tempo se diferencia.
Porém, não se engane, minha querida, imaginando que o fim está distante. O ciclo de vida-morte-vida acontece a tudo, a todos e o tempo inteiro. Eu mesma já morri em vida mais vezes do que posso contar. A própria Lua que nos observa do céu, cumpre este mesmo destino a cada mês. E a cada vez que renascemos, voltamos mais sábias.
O recolhimento é necessário para que os saberes sejam assentados. Pois a experiência é a única coisa que levaremos conosco.
Antes de partir, quero deixar este conselho: tudo tem seu tempo e o tempo precisa ser respeitado. Procure entender qual é o seu, meu bem, ouça seu corpo, respeite seu ritmo, guarde os saberes. Assim, viverá uma boa vida e honrará a todas que vieram antes de você.
Da sua bisa, que te ama mais do que tudo,
O.

