São Paulo, 16 de dezembro de 2023
Tobias,
Nossa noite foi ótima, como sempre. Tanto que fiquei em dúvida se deveria ou não lhe escrever. Mas, sabe, o que nós tivemos, até então, me parecia tão verdadeiro que me sinto na obrigação de lhe dizer algumas coisas. Nossa relação sempre foi livre. Nunca pedi que fosse de outra maneira, assim como nunca exigi de você qualquer tipo de devoção. Por isso, achei estranho encontrar duas taças de vinho, usadas, sobre a bancada da sua pia.
As coisas contam histórias, Tobias, você bem sabe. E eu estou aqui, me perguntando: que histórias contam duas taças com sobras de vinho tinto sobre uma pia? Com certeza, contam de momentos melhores do que contaria uma só. E se elas, as taças, pudessem falar, o que diriam, Tobias? Que estiveram em bocas urgentes? Que passearam por histórias de viagens? Que percorreram lábios que esperavam beijos? Não importa.
Não importa, Tobias, porque o que mais me incomoda, nessa cena, é a sua covardia. Porque é óbvio que eu sei que as taças foram deixadas lá de propósito. Foram um recado. De que eu não sou a única, de que você sai com outras pessoas, e tudo por quê? Porque você não tem coragem de se afastar ou de discutir seus sentimentos. Mas, fique tranquilo, Tobias, porque eu entendi o recado. E não é porque você sai com outras pessoas que eu decido me afastar. Eu me afasto porque não suporto gente covarde, gente que não se posiciona, que não tem coragem de dizer o que pensa, que não deixa claro o que incomoda. Eu me afasto, Tobias, porque mereço alguém que não arme cenas para fugir de conversas. Mereço alguém que me olhe nos olhos e me diga o que está sentindo. Percebe a pobreza dessas taças agora?
Cleide