São Paulo, 1º de Novembro de 2023
Irene querida,
Ontem, passei por uma situação incomum em um supermercado: um homem começou a falar comigo como se me conhecesse. Já que não o reconheci, disse-lhe, educadamente, que ele havia se enganado, no que ele insistiu. E começou a me perseguir dentro do mercado. Quando eu já não sabia mais o que fazer, resolvi parar e fingir que era a pessoa que aquele homem procurava. Disse-lhe : “tudo bem, vou fingir que sou a pessoa que você procura. Pois o homem ficou doido. Disse que eu não sabia de nada, que devia respeitá-lo e falava: “você não sabe de nada. Eu morri ontem, sabia? Por isso, não encontrei você”.
Enfim, ninguém no supermercado me ajudou ou tomou conhecimento da situação. E eu fiquei pensando sobre isso, em como nossa geração foi ensinada a fingir que não vê. Me permita, minha amiga, fazer uma correção sobre nossa última conversa, em que dizíamos que, antigamente, tudo era melhor.
Não era, amiga. O “antigamente” gerou a situação que temos hoje: indiferença, conservadorismo, aumento de violência, ganância, guerras, fome. Gerou pessoas que confundem sucesso com acúmulo de bens, com não precisar de ninguém para nada, que vivem solitárias pois não são capazes de compartilhar. Nós erramos muito, minha amiga, como geração. Acabo de perceber que esse “passado glorioso” é uma mentira que contamos a nós mesmos para não encararmos a verdade. A verdade é que o nosso passado está a um passo de estragar o futuro de todos.
Fátima

